terça-feira, 13 de julho de 2010

Criciúma - A Cidade que passou por cima do seu rio

A cidade de Criciúma passou por cima do seu rio e o mesmo está respondendo a agressão sofrida, com o transbordamento dos canais subterrâneos em decorrência das fortes chuvas, alagando as vias públicas e inundando estabelecimentos comerciais. Apenas no mês de janeiro de 2010 houve três enchentes com transtornos e prejuízos a população. Veículos ficam boiando nas vias públicas e comerciantes amargam com prejuízos que o seguro não cobre. Até o maior shopping da cidade foi alagado.

O crescimento desordenado da “Capital do Carvão” a partir da década de 1970 não valorizou a bacia do rio Criciúma e seus afluentes. A grande maioria dos córregos e riachos (atualmente 117) foram aterrados ou canalizados. Muitas nascentes foram obstruídas porque criavam banhados, ou seja, tornavam-se inconvenientes espaços no perímetro urbano não planejado. Ruas surgiam sem traçado algum para atender comércios estabelecidos sem nenhum critério. Não fosse a Linha Férrea, não existiria a Avenida Centenário como referência atravessando a cidade, possivelmente até os motoristas criciumenses se perderiam no complicado trânsito.

A Prefeitura Municipal de Criciúma será contemplada com recursos do PAC no valor de R$ 21.800 milhões para implantar o Projeto Básico Executivo de Macrodrenagem da Bacia Hidrográfica do Rio Criciúma elaborado pela PROSUL, porém não resolverá o conflito do transbordamento, poderá sim amenizar proporcionando o escoamento mais rápido das águas, mas continuarão a invadir as vias públicas e o comércio sempre que houver as assustadoras precipitações pluviométricas, que tendem a ocorrer com mais frequência e intensidade com as mudanças do clima.

O projeto foi elaborado para uma obra de engenharia com muita tubulação e muito concreto, ou seja, é uma tentativa de solução com o alargamento do curso do canal em alguns pontos, é, portanto paliativo. O recurso é público e precisa ser transparentemente bem aplicado sob o olhar da sociedade civil organizada. Chega de obras mal construídas e com desvios de verba em licitações manipuladas. Por isso deverá ser debatido no Comitê de Bacias do Rio Araranguá (CGBHRA) e em Audiências Públicas (AP) em local de fácil acesso ao público criciumense. Existe uma mania política na região de que não se deve intervir nos projetos,
mesmo que seja para torná-los úteis, pois a preocupação maior dos governantes e políticos é não perder a oportunidade da verba ser repassada as empreiteiras para a conclusão da obra, ou seja, o tal de resultado imediato, o mesmo errôneo e repetitivo procedimento que sempre resulta em problemas no futuro.

Os rios são como as veias do corpo humano, precisam estar sempre livres para a circulação do sangue, se gorduras se localizam em determinado ponto, é preciso retirá-las e o paciente deve adotar procedimentos e regime para evitar alimentos que contenham gordura. O caso do rio Criciúma é preciso renaturalizá-lo, dando-lhe condições de correr em seu curso, mas também é necessário adotar programas de aspecto preventivo como forma de reduzir o impacto das chuvas. Certa vez perguntei ao Senhor Manique Barreto (num casual encontro no aeroporto) o que deveria ser feito para reduzir o problema das cheias na cidade de Criciúma e o mesmo respondeu prontamente e sabiamente que deveria ser retirado tudo que estivesse sobre o rio. Imagine então a beleza cênica do Rio Criciúma restaurada, não mais sendo invadida pelo concreto da cidade. Pode até as atuais gerações não agradecerem, mas as futuras certamente que sim se realmente vir a ser executado algo decente e elogiável.

Não vemos o processo com a facilidade que os técnicos visualizam, resolvendo facilmente os problemas com soluções inviáveis no papel, quando na prática é bem complexo. Uma cidade colocou o seu rio na UTI e precisa salvá-lo, devolver a vida ao mesmo. Os pilares de construções privadas dentro do leito são como estacas no peito de alguém! O Estudo da PROSUL não é o que se esperava, mas faz um apontamento sincero e claro, quando afirma
‘’que as áreas localizadas as margens do canal do rio Criciúma devem ser consideradas como áreas de preservação permanente APP medidas a partir da margem do referido canal nas seguintes faixas: Largura de fundo do canal projetado igual a 09,00 metros e faixa da margem considerada APP igual a 30,00 metros.’’ Os técnicos precisam ir além e determinar a retirada de qualquer edificação que obstrua o curso da água e coloque em risco a segurança da população, pois cheias mais intensas poderão ocorrer.

Obviamente que nestas circunstâncias é preciso a participação do Ministério Público Estadual e Federal, para exigir o cumprimento da legislação da mesma forma que agem contra agricultores que utilizam as margens dos rios (mata ciliar) para o plantio e são processados. O rigorismo da lei tem que valer também no perímetro urbano. O Art. 2 do Código Florestal nº 4.771 de 1965 foi totalmente desobedecido, como também o Art. 3 da Resolução do CONAMA nº 303/2002 é bem clara quando defini o que é uma APP. A devastação da mata ciliar no rio Criciúma não atende nem o Código Ambiental de SC que é mais flexível quanto às suas dimensões.

Uma das primeiras alternativas é promover uma campanha que sensibilize os criciumenses a gostar do seu rio, valorizar a água que corre das nascentes e respeitar a mata ciliar. Pode até ser ‘’frescura’’ de ambientalismo, mas é um romantismo cientificamente comprovado que dá certo. Outra alternativa mais bruta/rígida é destruir as áreas de concreto desnecessárias que impermeabilizam o solo tanto em espaços públicos quanto privados. Se a água da chuva cai sobre áreas pavimentadas, a tendência é aumentar o escoamento para os cursos d’água e/ou áreas baixas da bacia. É um absurdo asfaltar as laterais da pista de uma rua ou avenida apenas para veículos estacionarem, esta faixa deveria se de paralelepípedo ou lajota para possibilitar a infiltração das águas. É preciso aumentar as áreas verdes para facilitar a infiltração das águas das chuvas. Certamente que havendo mais verde no perímetro urbano também reduzirá o insuportável calor na cidade de Criciúma.

O sistema de esgoto em implantação evitará em grande parte a contaminação dos recursos hídricos, mas a cultura do lixo também deve ser combatida, pois os resíduos urbanos assoreiam os canais e entopem as tubulações. Por outro lado no projeto de esgoto em andamento já era para ter previsto a construção de piscinões, grandes cisternas e caixas d’água nos prédios para a coleta de água da chuva.


As grandes riquezas econômicas de Criciúma deveriam também contribuir com a renaturalização ou revitalização do rio Criciúma, como uma espécie de medida compensatória pelos danos causados. É preciso algum sacrifício por parte de todos para reduzir o impacto das cheias no perímetro urbano da cidade como também na Bacia Hidrográfica do Rio Araranguá.



Por,
Tadeu Santos
Colunista "De Olho na Natureza"

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